I. No interior da oração serve:
1°) Para separar elementos que exercem a mesma função sintática (sujeito, objeto direto, objeto indireto, complemento nominal, agente da passiva, predicativo do sujeito, predicativo do objeto, adjunto adnominal, adjunto adverbial, aposto, vocativo), quando não vêm unidos pelas conjunções e, ou e nem. Exemplos:
A sua fronte, a sua boca, o seu riso, as suas lágrimas, enchem-lhe a voz de formas e de cores... (Teixeira de Pascoaes, OC, VII, 83.)
Os homens em geral são escravos; vivem presos às suas profissões, aos seus interesses, aos seus preconceitos. (Gilberto Amado, TL, 12.)
Achava os homens declamadores, grosseiros, cansativos, pesados, frívolos, chulos, triviais. (Machado de Assis, OC, I, 660-661.)
Observação: Quando ocorre polissíndeto, isto é, quando as conjunções e, ou e nem vêm repetidas numa enumeração, costuma-se separar por vírgula os elementos coordenados, como nestes exemplos:
Abrem-se lírios, e jasmins, e rosas. (A. de Oliveira, P, II, 344.)
Vai o fero Itajuba perseguir-vos Por água ou terra, ou campos, ou florestas; Tremei!... (Gonçalves Dias, PCPE, 523.)
Nem eu, nem tu, nem ela, nem qualquer outra pessoa desta história poderiam responder mais. (Machado de Assis, OC, I, 805.)
2°) Para separar elementos que exercem funções sintáticas diversas, geralmente com a finalidade de realçá-los. Em particular, a vírgula é usada:
a) para isolar o aposto, ou qualquer elemento de valor meramente explicativo:
Alice, a menina, estava feliz. (F. Namora, TJ, 30.)
A meu pai, com efeito, ninguém fazia falta. (O. Lara Resende, RG, 93.)
Conheço, sim, o cansaço do nosso corpo. (F. J. Tenreiro, OP, 100.)
b) para isolar o vocativo, inclusive o vocativo de cartas e comunicações:
— Que ideias tétricas, minha senhora! (J. Paço dArcos, CVL, 366.)
— D. Glória, a senhora persiste na idéia de meter o nosso Bentinho no seminário? (Machado de Assis, OC, I, 731.)
— Como é que tu te chamas, ó rapaz? (L. B. Honwana, NM CT, 87.)
c) para isolar os elementos repetidos:
— Nada, nada — dizia Vilaça todo amável — cá o nosso solzinho português sempre é melhor. (Eça de Queirós, O, II, 89.)
Contigo, contigo, Antônio Machado, Fora bom passear. (C. Meireles, OP, 344.)
— Só minha, minha, minha, eu quero!... (Luandino Vieira, VE, 86.)
d) para isolar o adjunto adverbial anteposto ou intercalado:
Lá fora, a chuvada despenhou-se por fim. (C. de Oliveira, AC, 17.)
À noite, às vezes, fazia barulho. (A. F. Schmidt, AP, 62.)
Fora, a ave agitou-se medonhamente. (Ó. Ribas, EMT, 86.)
Observação:
Quando os adjuntos adverbiais são de pequeno corpo (um advérbio, por exemplo), costuma-se dispensar a vírgula . A vírgula é, porém, de regra quando se pretende realçá-los. Comparem-se estes passos:
Depois levaram Ricardo para a casa da mãe Avelina. (J. Lins do Rego, U, 320.)
Depois, o engraçado são as passagens de nível, os aparelhos de sinalização, os vagões-cisternas... (A. Abelaira, D, 30.)
Depois, tudo caiu em silêncio. (Castro Soromenho, TM, 261.)
3°) Emprega-se ainda a vírgula no interior da oração:
a) para separar, em documentos, o nome do lugar: Paris, 22 de abril de 1983.
b) para indicar a supressão de uma palavra (geralmente o verbo) ou de um grupo de palavras:
No céu azul, dois fiapos de nuvens. (A. F. Schmidt, AP, 176.)
A tarde, de ouro pálido, e o mar, tranquilo como o céu. (G. Amado, TL, 33.)
Chuva, névoa, desconforto, A imagem da minha vida! (A. Botto, AO, 236.)
II. Entre orações, emprega-se a vírgula:
1°) Para separar as orações coordenadas assindéticas:
Acendeu um cigarro, cruzou as pernas, estalou as unhas, demorou o olhar em Mana Maria. (A. de Alcântara Machado, NP, 136.)
Pois eu caçava, visgava, alçapava. (Luandino Vieira, JV, 74.)
Veio a hora do almoço, o céu cobriu-se de negro, a chuva desabou, contínua e pesada. (A. Abelaira, D, 178.)
2°) Para separar as orações coordenadas sindéticas, com exceção das introduzidas pela conjunção e.
— Não me disseste, mas eu vi. (A. Abelaira, QPN, 19.)
Ou elas tocavam, ou jogávamos os três, ou então lia-se alguma cousa. (Machado de Assis, OC, II, 497.)
Não comas, que o tempo é chegado. (J. Saramago, MC, 356.)
Observações:
a) Separam-se geralmente por vírgula as orações coordenadas unidas pela conjunção e, quando têm sujeito diferente:
O sol já ia fraco, e a tarde era amena. (Graça Aranha, OC, 148.)
A mulher morreu, e cada um dos filhos procurou o seu destino (F. Namora, TJ, 23.)
Costuma-se também separar por vírgula as orações introduzidas por essa conjunção quando ela vem repetida enfaticamente:
Comigo, o mundo canta, e cisma, e chora, e reza, E sonha o que eu sonhar. (Teixeira de Pascoaes, OC, III, 27.)
E eles riem, e eles cantam, e eles dançam. (Ó. Ribas, EM T, 75.)
As conjunções porém, todavia, contudo, entretanto e no entanto, podem vir ora no início da oração, ora após um de seus termos. No primeiro caso, põe-se uma vírgula antes da conjunção; no segundo, vem ela isolada por vírgulas. Compare-se este período de Machado de Assis:
— Vá aonde quiser, mas fique morando conosco. (OC, I, 733.)
aos seguintes:
— Vá aonde quiser, porém fique morando conosco.
— Vá aonde quiser, fique, porém, morando conosco.
Em virtude da acentuada pausa que existe entre as orações acima, podem ser ditas separadas, na escrita, por ponto-e-vírgula. Ao último período é mesmo a pontuação que melhor lhe convém:
— Vá aonde quiser; fique, porém, morando conosco.
b) Quando conjunção conclusiva, pois vem sempre posposto a um termo da oração a que pertence e, portanto, isolado por vírgulas:
Não pacteia com a ordem; é, pois, uma rebelde. (J. Ribeiro, PE, 95.)
As demais conjunções conclusivas (logo, portanto, por isso, por conseguinte, etc.) podem encabeçar a oração, ou pospor-se a um dos seus termos. Assim como as adversativas, escrevem-se, conforme o caso, com uma vírgula anteposta, ou entre vírgulas. Veja-se a Observação 2. ao ponto-e-vírgula.
3°) Para isolar as orações intercaladas:
— Se o alienista tem razão, disse eu comigo, não haverá muito que lastimar o Quincas Borba. (Machado de Assis, OC, I, 546.)
— Amanhã mesmo vou encerrá-lo, assegurei, um tanto espanliiild com a facilidade com que assumia aquele compromisso. (C. dos Anjos, DR, 356.)
“Lá vem ele com as raízes”, resmungou Paulino, baixando a c ,ilirt,it (Castro Soromenho, C, 137.)
4°) Para isolar as orações subordinadas adjetivas explicativas:
O Loas, que tinha relações sobrenaturais, diagnosticara um espírito. (F. Namora, TJ, 24.)
Eu, que tinha ido ensinar, agora me via diante de trinta examinadoras. (Genolino Amado, RP, 24.)
D. Apolônia, que se habituara ao desdém das senhoras do Quinaxixe, não amolecia no entanto como patroa. (A. Santos, P, 66.)
Observação:
Como sabemos, as orações subordinadas adjetivas classificam-se em restritivas e explicativas.
As restritivas, necessárias ao sentido da frase, ligam-se a um substantivo (ou pronome) antecedente sem pausa, razão porque dele não se separam, na escrita, por vírgula. Já as explicativas, denotadoras de uma qualidade acessória do antecedente — e, portanto, dispensáveis ao sentido essencial da frase —, separam-se dele por uma pausa, indicada na escrita por vírgula.
Comparem-se, por exemplo, estes dois passos:
Não se lembraria do beijo que me jogara de longe, dos cravos que me atirara... (Ribeiro Couto, C, 85.)
Os dois espanhóis e meu tio, que o ouviam, olharam para mim. (J. de Sena, SF, 175.)
No primeiro, há duas orações adjetivas restritivas: que me jogara de longe e que me atirara; no segundo, uma oração adjetiva explicativa: que o ouviam. Daí a diversidade de pontuação.
5°) Para separar as orações subordinadas adverbiais, principalmente quando antepostas à principal:
Quando se levantou, os seus olhos tinham uma fria determinação. (F. Namora, NM, 243.)
Se eu o tivesse amado, talvez o odiasse agora. (C. dos Anjos, M, 146.) De tudo se lembrara nesse momento, porque de tudo queria esquecer depois... (A. de Assis Júnior, SM, 140.)
6°) Para separar as orações reduzidas de infinitivo, de gerúndio e de particípio, quando equivalentes a orações adverbiais:
A não ser isto, é uma paz regalada. (Castro Soromenho, C, 225.)
Sendo tantos os mortos, enterram-nos onde calha. (J. Saramago, MC, 221.)
Fatigado, ia dormir. (Lima Barreto, TFPQ, 279.)
Conclusão
Finalizando as nossas observações, devemos acentuar o seguinte:
a) toda oração ou todo termo de oração de valor meramente explicativo pronunciam-se entre pausas; por isso são isolados por vírgulas, na escrita.
b) os termos essenciais e integrantes da oração ligam-se uns com os outros diretamente; não podem, assim, ser separados por vírgula.
c) há uns poucos casos em que o emprego da vírgula não corresponde a uma pausa real na fala; é o que se observa, por exemplo, em respostas rápidas do tipo: Sim, senhor. Não, senhor.
d) as orações subordinadas substantivas apositivas devem ser separadas da oração principal por vírgula ou dois-pontos, assim como ocorre com o aposto.
e) a vírgula não separa as orações subordinadas subjetivas, objetivas diretas, objetivas indiretas, completivas nominais e predicativas. Afinal, sujeitos, complementos verbais e nominais não se separam por vírgula do termo ao qual se referem. O mesmo critério se aplica ao predicativo nos predicados nominais.
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